18 maio 2009


Cinema Monumental

Não era um edifício belo, mas ainda assim era muito mais bonito e enquadrado no que, na minha modesta opinião, deve ser o casario da zona nobre de uma capital, do que o mono pindérico-maricóide que agora lá está e que lhe usurpou o nome.

Era "forte e feio", mas tinha uma excelente qualidade de construção e espaço, "montes"de espaço!

A diferença é tanta, que o actual "Monumental" desde que foi inaugurado em 88, tem estado constantemente em obras e os cinemas com poucos anos de uso, estavam mais degradados que o antigo no fim dos seus dias.

Mas o que quero contar não é a história do "Monumental", é uma história que tem o "Monumental" por "epicentro", digamos assim, e que tem por tema não o "orgulho e preconceito", mas a mais "lusitana" mistura de "ingratidão e preconceito".

O meu tio Manuel, solteirão boémio, pintor, poeta e "intelectual" de avant-garde, era um leitor ávido e um cinéfilo compulsivo e sempre viveu na zona do Saldanha; como "devorava" filmes, era assíduo espectador do Monumental e frequentador do café Monte Carlo, tinha, por isso, uma roda de amizades e conhecimentos nessa zona de Lisboa.

Um desses conhecimentos, não sei exactamente de que tipo, era uma senhora que trabalhava precisamente no Cinema Monumental, já um pouco entradota, mas muito bem arranjada, cabelo, unhas e lábios sempre muito bem pintados, com um ar assim entre a "manicure" um pouco já fanée e uma mulher da pequeníssima burguesia alfacinha e que muito à portuguesa arranjava "borlas" para o Cinema;
o meu tio apresentou-me à senhora como sobrinho e como cinéfilo, pelo que passei, também, a beneficiar das ditas "borlas".

Essa senhora trabalhava, mais precisamente, nas casas-de-banho do Cinema e como a sociedade portuguesa era, (e ainda é, se bem que num registo mais sonso) pelo menos em projecção representacional, muito estratificada, as "borlas" que lhe competiam nesse ranking distribuir, eram para o modesto 2º Balcão.

Repare-se que estou a falar do Portugal de meados dos anos 70, de um pouco antes a um pouco depois do 25 de Abril.

Os bilhetes oferecidos eram dois, pelo que comecei por levar um ou outro amigo do Barreiro e um ou outro colega da Faculdade e eles iam entusiasmaddos com a ideia de verem um filme de graça, mas quando percebiam que a minha "amiga" era afinal a empregada dos WC, desatavam, invariavelmente, num gozo alarve.

Se fosse necessária alguma prova de como em Portugal a ingratidão e o preconceito social (aliados, claro está, a uma "monumental" imaginação escatológica) são "unha com carne", eis que estava dada!

Por isso, dado o "histórico" e por que nessas coisas vale mais ser "empirista", nunca lá levei fosse que rapariga fosse (nem colega, nem amiga, nem, por maioria de razão, namorada)!!!

Postado por imank in "marksnops."
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